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Mostrando postagens de abril, 2015

o outro caderno

Dois episódios da maledicência em Porto Alegre

         I Segue, aqui e ali (talvez mais aqui do que ali), a histeria com relação às cotas. Segue a falácia do racismo reverso cuspida contra os negros que respondem sem comiseração ao melífluo interlocutor. Segue a retranca cheia de dedos de muitos brancos na medida em que percebem que o enfrentamento do preconceito pode se dar, sim, por meio de ações concretas (mesmo porque já estamos de saco cheio de tanta interpolação) e não apenas na base de discussões iniciadas com a quase resignada locução "veja bem...". Segue a tolerância oportunista com a nossa justificada impaciência. Segue a desconsideração de que ainda somos “julgados de forma leviana, burra e preconceituosa” e que as palavras continuam ambíguas e “injustas na boca de quem reclama”, com a barriga cheia de mariola, reagindo à nossa suposta insolência. Segue o crescente conservadorismo da imprensa em geral e do cronista que disputam o qualificativo “barato” na esperança de falar bem de pe

poesia ‘acontecimento’: Cair de costas

A poesia ‘acontecimento’ em Cair de costas Por Erre Amaral O poeta e ensaísta Cândido Rolim inicia o seu posfácio para a coletânea de poemas Cair de costas de Ronald Augusto, com a seguinte afirmação: “Até que enfim uma poesia me comunica que não quer comunicar. Que sua função é outra: cair fora do ‘sistema unívoco da linguagem’ (Adorno), ‘significar a esmo’, jamais atingir uma margem, nem o ambíguo conforto da forma. Enfim uma escritura que, após o front da linguagem, os secretos escrutínios, funda outros desafiadores sentidos”. Após a leitura dos desterritorializantes poemas do Ronald, não há como não concordar com Rolim, não só com o parágrafo introdutório de “Fissuras em Cair de costas ”, acima mencionado, mas com todo o conteúdo ensaístico de seu instigante posfácio. No entanto, gostaria de fazer uma outra arriscada leitura, transversal a de Rolim, sobre a obra em questão. Arriscada porque o chão onde pisarei é um tanto escorregadio, posto que fragmentário e h

Miscigenação da forma artística e despedida da palavra em Cair de Costas

Miscigenação da forma artística e despedida da palavra em Cair de Costas por Guilherme Mautone Muitos conhecem o debate travado por Lessing no século XVIII sobre os limites entre a pintura e a poesia. O Laocoonte (1766), obra seminal do autor alemão, exerceu enorme influência entre seus pares – entre eles Goethe, que recebe-a com invisto ent usiasmo pelo seu estatuto inegavelmente preciso. Jamais, antes de Lessing, haviam ficado tão claras, tão distintas, as diferenças ontológicas e as diferenças epistêmicas entre a obra pictórica e a poética. A primeira, inscreve-se no espaço através de figuras e cores. A segunda, no tempo através de sons articulados. É com essa formulação bastante óbvia para o homem comum do século XVIII que Lessing antecede a máxima lançada séculos mais tarde por Lacan: de que o óbvio, às vezes, precisa ser dito. Mas serão tão evidentes assim as formulações de Lessing? Serão, ainda hoje, possíveis? O auge de todo racionalismo (e não foi o classic