Alguns
poemas meus, traduzidos por Patrick
Quillier, que se encontram reunidos em Retendre la corde vocale: anthologie de poésie brésilienne
vivante (2016). A obra foi organizada e traduzida por Patrick Quillier, poeta e ensaísta.
Quillier, além de Professor da Faculdade de Letras da Universidade de
Nice, é organizador e um dos tradutores de Œuvres poétiques (2001) de
Fernando Pessoa lançada na coleção La Pléiade da editora Gallimard.
FISSURES
DE LANGAGE
1
c’est
vraiment la dernière semaine
ensuite
partir direction mon temps
(temps
toujours plus sec
sur les
sols le fumier ne prend pas à la gorge :
déshydraté
le soleil lui a été extrême
l’humidité
a connu une belle fin)
j’étais à
la recherche d’un terme
qui ne
soit en rien propret ni exempt
de
coquilles pour dire à temps
et sans
rêver ce qui ne coûtant rien
s’est mis
à battre dans ma pensée-silhouette
mais rien
que virtuellement j’ai tapé dent
je ne suis
pas arrivé à l’emmener au vent
à lui
dire : rue
……………………..
elle va à serein
j’ai
compris vain est tout mouvement
relatif à
ce moment
difficile
de signifier à vue de nez
ce qui
était au fond je ne m’en souviens pas
une idée
mi figue mi raisin la loose
rien qui
mérite autre chose que de la prose
sans rime
de tous côtés une méprise
2
comme il
reste trois heures et quelque
que
puis-je dire d’autre qui ne
soit la
touche finale d’un fou ?
comme il
reste trois heures de route
je peux
coudre de maigres tissus
années
folles au fil fin
je peux
demander du début :
pourquoi as-tu
été si confus ?
je
réponds : je lisais s/mort
car ma
main ne pouvait écrire
d’une
autre façon mon sort
les
erreurs stochastiques sont
fréquentes
dans de tels offices
peut-être
étais-je allé loin
trop loin
dans cette fissure
de langage
FISSURAS DE LINGUAGEM
1.
esta
é a última semana mesmo
depois
partir rumo ao meu tempo
(tempo
cada vez mais seco
no
chão não assusta o esterco:
enxuto
o sol lhe foi extremo
a
umidade teve bom termo)
estava
a procurar um termo
não
de todo limpo nem isento
de
gralhas para dizer a tempo
de
não sonhar o que a custo zero
pulsou
em meu vulto-pensamento
mas
só virtualmente marquei tento
não
consegui conduzi-lo ao vento
dizer-lhe:
rua
vai ao sereno
entendi
vão todo movimento
no
tocante a este momento
difícil
significar a esmo
o
que era no fundo não lembro
uma
idéia meia-sola sestro
nada
que merecesse um metro
rimas
de lado a lado um erro
2.
faltando
três horas e pouco
o
que posso dizer que não
seja
arremate de louco?
faltando
três horas de estrada
posso
costurar breves panos
anos
doidos com linha magra
posso
perguntar pelo início:
por
que você foi tão confuso?
respondo:
lia des(a)tino
pois
minha mão não anotava
de
outro modo o meu destino
erros
estocásticos são
comuns
em semelhante ofício
talvez
eu tenha ido longe
longe
demais nesta fissura
de
linguagem
[de Confissões Aplicadas, 2004 (Confessions appliquées)]
AUTRE
FAUVE ALLÉGORIQUE
la vache
couleur d’argile
je venais
de loin j’allais loin
quand elle
m’a vu
j’ai
trouvé dans son œil de ruminant
une menace
il y avait
une bifurcation
où faire
filer l’espérance
et la
crainte
près de
moi à chaque pas
ses bouses
avant ce
match nul
j’écoutais
les crapauds
chaque
coassement était un trou
spongieux
d’où un son
d’eau
opaque
outra fera alegórica
a
vaca cor de barro
eu
vinha de longe em longe
quando
ela me viu
achei
no seu olho de boi
um
ameaço
havia
uma bifurcação
por
onde enfiar a esperança
e
o temor
ao
pé de mim a cada passo
suas
bostas
antes
deste empate
eu
ouvia os sapos
cada
coaxar era uma buraco
esponjoso
de onde um som
de
água opaca
[de No Assoalho Duro, 2007]
1
1948-2004
orum le
palindrome
(mur ô) en travers
du front
des sans-narines
orum
n’oscille pas
entre être
quelque chose
ou rien
il ne
tient pas en main
mais la
réflexion le
réflexionne
tellement
et en
telle façon
que
parfois elle arrive même
à retenir
dans un photogramme
le ciné-orum
en termes
de
proche
afrographie
prêtée au
silence
du corps
*
noirceur
de transegum
axévier
hypérion est
mon
hippogramme mon
paragramme
encerclement
d’obsessions
acoustiques
accoudoir
qui s’anagrammatise
hors de la
consécutivité de la
clausule
temporelle
programme
de nègre
software
gratte-ciel
supplément
de
xangô
plurilingue
dans
l’ornière
de xangô
xangê
nez à nez
avec
arnaldo
l’a
chambré s’est fait
chambrer
1948 - 2004
orum o
palíndromo atravessado
na frente dos sem-narinas
o orum não oscila
entre ser algo
ou nada
não queda à mão
mas o pensamento o
pensamenta tanto
e de tal modo
que às vezes até consegue
deter num fotograma
o cine-orum
em termos de
rente afrografia
emprestada ao silêncio
do corpo
*
negror de transegum
axévier hipérion é
meu hipograma meu
paragrama
cerco
de obsessões acústicas
encosto que se anagramatiza
fora da consecutividade da
cláusula temporal
programa de negro
software rasgacéu
achega de
xangô multilingual
na
quebrada
de xangô xangô
de cara
com o arnaldo
xingou e foi
xingado
***
orun
the traversed palindrome
in front of the nostril-deprived
orun oscillates not
between being something
and nothingness
it escapes the reach of the hand
but thought thinks so much of it
to the extent that
at times it even succeeds
in leaving a photogram
an orun-ciné
in terms of
close afrography
lent to the silence
of the body
*
transegun jet black
axévier hyperion
my hypogram my
paragram
acoustic-obsessive circle
strut that anagrammatizes
beyond the consecutiveness
of temporal clause
black program
heaven-piercing software
multilingual Sango
arrangement
in
territory
of the sangoesque
when annoyed
with Arnaldo
he insulted and
was insulted
orum o
palíndromo atravessado
na frente dos sem-narinas
o orum não oscila
entre ser algo
ou nada
não queda à mão
mas o pensamento o
pensamenta tanto
e de tal modo
que às vezes até consegue
deter num fotograma
o cine-orum
em termos de
rente afrografia
emprestada ao silêncio
do corpo
*
negror de transegum
axévier hipérion é
meu hipograma meu
paragrama
cerco
de obsessões acústicas
encosto que se anagramatiza
fora da consecutividade da
cláusula temporal
programa de negro
software rasgacéu
achega de
xangô multilingual
na
quebrada
de xangô xangô
de cara
com o arnaldo
xingou e foi
xingado
***
1948
– 2004
[Tradução: Niyi Afolabi]orun
the traversed palindrome
in front of the nostril-deprived
orun oscillates not
between being something
and nothingness
it escapes the reach of the hand
but thought thinks so much of it
to the extent that
at times it even succeeds
in leaving a photogram
an orun-ciné
in terms of
close afrography
lent to the silence
of the body
*
transegun jet black
axévier hyperion
my hypogram my
paragram
acoustic-obsessive circle
strut that anagrammatizes
beyond the consecutiveness
of temporal clause
black program
heaven-piercing software
multilingual Sango
arrangement
in
territory
of the sangoesque
when annoyed
with Arnaldo
he insulted and
was insulted
[publié dans Black
notebooks: contemporary afro-brazilian literary movement, Africa World
Press, Inc, 2008, Trenton, NJ]
2
DEUX SUR
DEUX : OLOMÍ
mer en
fête les gens
infestant les eaux de la grande mère
l’assiéyage des cuisses surmontées
par des hanches de contrebasse l’accorte
robe à la
vie propre qui se
soutient de ses propres barres
bleu-profond
courant du cou aux coudes
léchant de
près ses courbes
onctueuses toujours recommencées
elle
déambule en dame en madame sur une écume de fleurs
elle se déploie lustrée
danseuse
de pensée melliflue
flegme de flamme blanche
pétales
verts un pied après l’autre
œil allongé rien que pour ce qui se
trouve
au niveau
de ses yeux elle se répand
va-et-va (modèle d’aéroport)
infatigable
ou alors
comme sur un brancard de procession
suspendue au-dessus de la douleur et
de l’adoration
sereine
sirène sain(t)e et sauve
avion emportant à pic une foule de
barques
de jouets
objets d’artisanat commercial
elle débite des choses bon marché
sur la plage
claire
odalisque de toutes les lunes, loas et houles
odoriférant
popotin baroque
ses hanches justifient l’épithète :
secoueuse
de la terre
aine dénudée polie comme une conque
dans sa
concavité
si homère avait connu iemanjá iorubá
il aurait
peut-être configuré plus douce
la mer d’ulysse fils de laërte
dois do dois: olomí
mar em festa as gentes
infestando as águas da mãe grande
o sentamento das coxas encimadas
por quadris de contrabaixo o velido
vestido com vida própria que se
sustenta nas próprias barras
longo-cerúleo
a escorrer do colo até os tornozelos
lambendo rente suas curvas
untuosas sempre recomeçadas
deambula senhora dona sobre escuma de flores
deslinda-se lisa
bailadora de melífluo pensamento
fleuma de chama branca
pétalas verdes um pé após outro
olho alongado apenas para o que está
à altura dos seus olhos se espraia
vai-vai (esteira de aeroporto) incansável
ou como que pousada em andor
suspensa acima de dor e adoração
serena sereia sarada
avião levando a pique cópia de barcos
de brinquedo objetos do artesanato mercante
desova de coisas baratas
na praia clara
odalisca de todas as luas loas e olas
olorosa bunda barroca
suas ancas justificam o epíteto:
sacudidora da terra
sovaco nu polido como a concha
pelo lado côncavo
se homero conhecera iemanjá iorubá
talvez conformara mais doce
o mar de odisseu filho de laertes
mar em festa as gentes
infestando as águas da mãe grande
o sentamento das coxas encimadas
por quadris de contrabaixo o velido
vestido com vida própria que se
sustenta nas próprias barras
longo-cerúleo
a escorrer do colo até os tornozelos
lambendo rente suas curvas
untuosas sempre recomeçadas
deambula senhora dona sobre escuma de flores
deslinda-se lisa
bailadora de melífluo pensamento
fleuma de chama branca
pétalas verdes um pé após outro
olho alongado apenas para o que está
à altura dos seus olhos se espraia
vai-vai (esteira de aeroporto) incansável
ou como que pousada em andor
suspensa acima de dor e adoração
serena sereia sarada
avião levando a pique cópia de barcos
de brinquedo objetos do artesanato mercante
desova de coisas baratas
na praia clara
odalisca de todas as luas loas e olas
olorosa bunda barroca
suas ancas justificam o epíteto:
sacudidora da terra
sovaco nu polido como a concha
pelo lado côncavo
se homero conhecera iemanjá iorubá
talvez conformara mais doce
o mar de odisseu filho de laertes
*
s’
auto
dénomment
ramages intelligents
et
pourtant
attrapent un
blablalocutorio
dans le
tramail de leur pensée
se
resserrent ensuite
l’écrasent
amuïssement
démoralisé du maquis massacre-chevaux
bordure
de
l’incertain sentier
de tant de
peines
pannes
et panades
*
auto
denominam-
se
ramagens inteligentes e
todavia
engatam farfalatório
num esgalho do pensamento
estreitam-se em seguida
esmagam o
amuo desalmado do mato matacavalo
borda
da incerta vereda
de tanta pena
peneira
e pernada
denominam-
se
ramagens inteligentes e
todavia
engatam farfalatório
num esgalho do pensamento
estreitam-se em seguida
esmagam o
amuo desalmado do mato matacavalo
borda
da incerta vereda
de tanta pena
peneira
e pernada
OGUN, 2004
l’ajustement
du quatre
ogun
justicier incarné
les armes
du mercure
nez aux
sauvages ailerons
les talons
ailés d’hermès
l’épée et
la parole armes
de jorge
wordswordswords
swords
parolaction braise attisée sans cœur
verba
un pour
ogun
dépouilles
de guerre
banquet
après une expédition de conquête
ogun assis
fermefort dans le quatre
si ce
dégât-là a écarlatelé
son siège
ogun boit-un
tournoie dédicuivré le compas à la pointe
d’un
quatre
tacle au
crampon qui coupe
toujours
au-dedans de l’équerre
ogun nous écarte
des portraits et
des soleils carrés
ogun brougouroundoun dans les quatre
grands-parents
qu’une quelconque bête par trop cadrée
à l’épaule
de l’irascible n’arrivent pas
les
retardataires dards de l’envie
ogum, 2004
o assentamento do quatro
ogum justiceiro encarnado
as armas de mercúrio
nariz de abas brabas
os tacões alados de hermes
a espada e a palavra armas
de jorge
wordswordswords
swords
parolagem brasa assoprada sem coração
verba
algum para ogum
despojos de guerra
banquete após uma expedição de conquista
ogum sentado firmeforte no quatro
de sua cadeira vermelha
aquele estrago
ogum bebum
gira dedibrônzeo o compasso na ponta
de um quatro
entrada de sola que talha
sempre dentro do esquadro
aparta-nos ogum de retrato e
de sol quadrado
o assentamento do quatro
ogum justiceiro encarnado
as armas de mercúrio
nariz de abas brabas
os tacões alados de hermes
a espada e a palavra armas
de jorge
wordswordswords
swords
parolagem brasa assoprada sem coração
verba
algum para ogum
despojos de guerra
banquete após uma expedição de conquista
ogum sentado firmeforte no quatro
de sua cadeira vermelha
aquele estrago
ogum bebum
gira dedibrônzeo o compasso na ponta
de um quatro
entrada de sola que talha
sempre dentro do esquadro
aparta-nos ogum de retrato e
de sol quadrado
ogum brugurundum nos quatro
costados de qualquer besta quadrada
à espádua do iracundo não chegam
os retardatários dardos da inveja
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